Quando analisamos o contexto histórico presente, percebemos que a maneira como a sociedade tem se organizado desde a Revolução Industrial vem causando, ao longo do tempo, o uso sem precedentes dos bens naturais, a destruição de habitats naturais e a pulverização da biodiversidade.
Esse problema tem sido trazido à tona de maneira mais recorrente que antes, devido principalmente ao aquecimento global, que tem trazido eventos climáticos antes não vistos, afetando a agricultura e ameaçando a moradia de muitas pessoas, principalmente a população marginalizada. Isso levou as autoridades e até mesmo as empresas a se preocuparem com a sustentabilidade, já que o uso desenfreado dos recursos naturais afeta a cadeia de abastecimento e até mesmo a economia como um todo.
Considerando essas circunstâncias e o despertar do ser humano sobre a contrariedade de se viver esse estilo acumulativo, surge a necessidade de um novo modo de vida e a agrofloresta aparece como uma possibilidade, pois envolve temas como o viver em sociedade, a economia solidária, o respeito à cooperação de todos os indivíduos considerando a sabedoria e a singularidade de cada um.
É no processo de respeitar o território e a cultura local, sem tentar padronizar tudo e todos que a agrofloresta tem ido muito além de ser somente uma maneira de produzir alimentos. Ela traz consigo um conceito, em que a diversidade, não somente de cultivos, mas de fatores humanos, históricos e culturais, é protagonista.
Essa ideia contesta a padronização do modo de vida atual, que é vista tanto na alimentação, com monocultivos, como na maneira de tentar organizar o modo de consumir e pensar da população, ao sufocar a cultura local, banalizando a maneira de viver de quem pensa diferente, enfraquecendo vínculos e pregando um individualismo que tira a força da comunidade.
Como o curso abordou os conceitos de agrofloresta
O curso “Conectando Paisagens e Pessoas” trouxe vários temas que são essenciais para mudança desse padrão de sociedade. O primeiro ponto que foi levantado é sobre como a comunicação é essencial para trazer a participação da comunidade, e a arte pode fazer despertar em cada um a reflexão sobre problemas que já sabíamos que estavam lá, porém, nunca havíamos refletido sobre.
O tema que abriu o curso foi a importância das florestas, com seus serviços ecossistêmicos, além do seu papel no sequestro de carbono, tema tão recorrente em debates globais. Estamos em um país que tem uma biodiversidade gigante, com biomas como a Amazônia, com 49% do território, o Cerrado com 25%, a Mata Atlântica com 13% do país, e que foi bastante reduzido, restando pequena fração do que ocupava antes. A Caatinga, com 9% e o Pantanal com 1,8% do território, sendo a maior área inundável do planeta e que está secando, além dos Pampas, no sul do Brasil, com 2,1% do Brasil, bioma também muito ameaçado.
Como há uma fragmentação dessas florestas, suas funções ecossistêmicas tão importantes para a sobrevivência do ser humano têm sido enfraquecidas. Além disso, o fluxo gênico, essencial para a biodiversidade das espécies, também não ocorre de maneira tão eficiente como em um ambiente conservado.
O projeto Corredor Caipira, realizado pelo Nace-Pteca, Esalq/USP e Fealq e patrocinado pela Petrobras, busca conectar os fragmentos desses remanescentes de florestas, para que haja conectividade entre eles, além de se conectar pessoas para um bem comum, e que as despertem para ações de conservação.
Sobre a restauração e seu objetivo de se chegar o mais próximo do ambiente original, é importante lembrar o quanto a resiliência do local traz maior facilidade para restaurar, com locais muito degradados tendo maiores custos e dependendo muito de sua proximidade com as espécies nativas. Com base nesses fatores, é feita a seleção de técnicas, que vão desde introdução de propágulos até adensamento e regeneração passiva.
A restauração está dentro dos valores da agrofloresta, já que o ser humano está intrinsecamente ligado à natureza, assim como ao seu próximo e a si mesmo. O bem viver, é um conceito que aborda a força da comunidade, baseado na vida plena, em harmonia consigo e com outras espécies, inclusiva, diversa e que faça cada um se sentir parte de algo maior, criando um reencantamento com o mundo e se abrindo para diálogos. Além de estar mais presente no agora, se conectar, escutar, confiar no processo sem se impor.
Considerando que o ser humano já tem essa necessidade de mudar seu meio, não aceitando as injustiças, o incentivo da participação é essencial, o que pode ser feito por meio de políticas públicas, com participações em questões sociais, principalmente para a população em seu próprio território.
A agrofloresta e a agroecologia também propõem a viabilização de novos produtores, mostrando que, para combater a fome do mundo, precisamos tratar a desigualdade, abordando temas como a agricultura familiar, soberania alimentar, comércio local baseada em princípios ecológicos e participação social, sem hierarquizar os saberes.
A transformação por meio da agrofloresta
Conclui-se que a maneira em que a sociedade vem se organizando tem sido questionada pelos próprios indivíduos inseridos nela. É necessário pensar em formas de viver mais harmônicas com o território, com a cultura local e com a natureza. A agrofloresta abrange exatamente isso, pois é uma alternativa de vida que respeita a singularidade de cada um, seus saberes e inclui minorias e comunidades marginalizadas.
Apesar de ser considerada utópica, já se percebe um despertar no ser humano no que corresponde à indignação de viver em um modelo de sociedade que têm cobrado um alto preço ao planeta, mostrando que esse modelo não é sustentável a longo prazo.
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Escrito por Mayara Diehl Rodrigues, engenheira florestal e estudante do curso “Conectando Paisagens e Pessoas”