Mudança da paisagem, Bem Viver e participação

Saiba o que é a proposta do Bem Viver e como se relaciona com a transformação de paisagens e pessoas

Nestes tempos em que rufam tambores de uma caótica transformação socioambiental, estamos desvelando, no contexto da pandemia de 2020/2021 e de outras múltiplas crises sem precedentes, uma oportunidade, também sem precedentes, de revisão de nossos modos de vida pautados pelo materialismo e individualismo, para novos paradigmas de maior diversidade biológica e social que abram alas para a participação, dignidade e visibilidade de todas e todos, incluindo as outras espécies que compartilham este planeta. 

Podemos olhar para este momento caótico atual como um momento de “reconstruir a história com”, de despertar, de retomar a vida, a nossa potência de transformação.

Este momento de crises é um ensejo para fazer uma transição profunda, a de buscar uma maior participação na vida, buscar soluções coletivas para os desafios e contribuir para inspirar mais pessoas a se engajarem e também participarem da vida. Aproveitar esta oportunidade de contribuir para estas transformações é o trabalho do projeto Corredor Caipira – Conectando Paisagens e Pessoas.

Este projeto é realizado pelo Núcleo de Apoio à Cultura e Extensão Universitária em Educação e Conservação Ambiental (Nace-Pteca) da Esalq/USP e pela Fundação de Estudos Agrários Luiz de Queiroz (Fealq), com o patrocínio da Petrobras, por meio do Programa Petrobras Socioambiental. 

Restaurar nosso Bem Viver

O Projeto Corredor Caipira, entende que parte desta transição inclui uma mudança nas paisagens em que vivemos. Esta mudança, que demanda a restauração das florestas, a conservação da água, do solo e do ar,  também passa necessariamente por uma mudança cultural, no sentido da Cultura como modo de viver. Transformando um modo de vida calcado na reverência à produção, ao consumo e ao crescimento baseado na acumulação de bens materiais, inviável para a manutenção da vida, para uma vivência humana inspirada no Bem Viver, na qual a riqueza está em estabelecer um equilíbrio entre recursos disponíveis na Terra e as necessidades fundamentais da humanidade.

O Bem Viver é uma proposta de reconstrução democrática da democracia, pautada na garantia dos direitos humanos e da natureza e na desconstrução da meta do progresso em sua versão produtivista. Nasce da visão de mundo dos povos indígenas e se alimenta da urgência de estabelecimento de uma vida harmônica entre os seres humanos e deles com a natureza, através da busca por maneiras distintas de viver.

Uma forma de avançar nesta transição em direção a modos de vida mais harmônicos é através de uma prática educadora ambientalista comprometida com a construção destes novos modelos de sociedades a partir da participação. Faz-se necessário o exercício constante de retomada da habilidade de participar. O participar é em si a superação da visão e da vivência fragmentada imposta pelo nosso modo de viver atual. 

Mas  de que participação estamos falando?

Aqui, a participação é entendida como aquela que se cria a partir do diálogo com a diversidade e é comprometida com: os direitos de todos os seres e o cuidado mútuo; a regeneração e restabelecimento da dignidade de todas as pessoas, das mulheres, dos LGTQIA+, dos povos afrodescendentes, dos povos indígenas, das agricultoras e agricultores e das trabalhadoras e trabalhadores; o reencontro com nossas raízes, nossa cultura e nossa história e, necessariamente, com a restauração da natureza. 

Esta participação que estamos falando tem como uma das finalidades primordiais o “sentir-se parte”,  o “pertencer a algo maior”, a um grupo, a um lugar, a uma comunidade. Os desdobramentos que podem vir a acontecer a partir desse sentimento de participar na vida reverberam em criação de identidade, engajamento, compromisso individual e coletivo com o cuidado, com o compartilhar e com o agir em prol de um bem comum e de uma mudança. 

Os processos educadores desenvolvidos pelo Corredor Caipira buscam promover este tipo de participação, por entendermos que, se queremos restaurar nossas paisagens, precisamos também restaurar nossos sentimentos de pertencimento e conexão com elas e com os seres que as habitam, incluindo toda a diversidade de comunidades humanas. Afinal, é a partir destes sentimentos que se cria envolvimento com a realização das mudanças necessárias para o estabelecimento de um Bem Viver ou de modos de vida mais harmônicos, solidários e felizes. Participe!

Veja também: A Educação e a Cultura no Projeto Corredor Caipira

Escrito por Karine Faleiros (Engenheira Florestal com especialização)